| Rotura uterina espontânea
          precoce em gravidez de 20 SemanasDr. Renato Ajeje, Dra. Cláudia Aparecida da Silva e Carlos E.
      Engel Velano
 
      
      Resumo
      
      O presente trabalho relata um caso de rotura uterina espontânea e precoce em uma paciente de 22 anos, com história pregressa de 3 cesáreas anteriores, sendo a última ocorrida há 8 meses. A mesma deu entrada em nosso serviço, no dia 7 de março de 2000, com idade gestacional de 19 semanas e 6 dias, apresentando quadro inespecífico de dor abdominal e hemorragia. Após minuciosa investigação clínica chegou-se ao diagnóstico de rotura uterina, tendo conduta em tempo hábil, sendo realizado intervenção cirúrgica não conservadora.
Palavras-Chaves: Rotura uterina, cicatriz uterina, cesariana, multiparidade Introdução 
  Rotura Uterina (RU) é a principal e mais grave complicação obstétrica, sendo responsável
  por uma elevada taxa mortalidade materno-fetal (1). Foi descrita pela primeira
  vez, por Guilherme Smellie, no século XVIII, a despeito de ser episódio trivial nessa época
  (2). Muitos anos rodaram até Ames (1881) reconhecer-lhe a gravidade representada pela rotura uterina
 (3). A incidência de RU foi avaliada (incluídos todos os tipos ) variando de 1:100 a 1:11.000 partos nos Estados Unidos
 (2). Comprova-se que a RU em órgãos sem cicatriz, é atualmente, excepcional na prática obstétrica, e com incidência bem reduzida, pós-cesárea
  segmentaria ou miomectomia (4). Pode ser classificada quanto a época de ocorrência (durante a gravidez
  ou o parto), quanto ao determinismo (espontânea ou traumática); quanto à solução
  de continuidade (completa ou incompleta); quanto à localização (corpo, segmento
  ou colo). A RU é caracterizada por sintomas e sinais característicos, como
  por exemplo, dor, choque, hemorragia, paralização do trabalho de parto, apresentando
  sinais característicos de distenção segmentária ou sinal de Bandl; o sinal
  de Frommel e durante a palpação pode ser identificado o sinal de Clark. O prognóstico
  fetal é muito grave e desanimador 
  (5) , a mortalidade perinatal manteve-se entre 16,7 e 58,3%, sendo que as estatísticas recentes referem letalidade de 0 a 58,3% (2).
 Relato de Caso
  Paciente E.A.A., 22 anos, admitida na maternidade do Hospital Universitário
  Alzira Velano, relatando: perda da consciência há 20 minutos, com duração
  de 8 minutos, seguida de dor intensa abdominal, tipo cólica, sem irradiação,
  sem fator agravante ou atenuante. G4P3A0, 3PC com data do último parto (cesárea)
  há mais ou menos 8 meses, com IG de 19 semanas e 6 dias sem acompanhamento
  de pré-natal e negando qualquer uso de medicamentos. Ao exame clínico apresentava-se
  hipocorada, com tremores de extremidades, sem edemas, normotensa, e taquicárdica.
  Com AUF de 15cm, e batimento cárdio-fetal ( BCF) de 126 bpm. Ausência de contração
  com colo posterior longo e fechado. Após 30 minutos de admissão evoluiu com
  sangramento vaginal em moderada quantidade e BCF de 150 bpm .Realizado exame
  ultra-sonográfico com laudo de IG de 19 semanas e 3 dias, associado à imagem
  hiperecogênica, arredondada de mais ou menos 11cm, em região lateral direita
  do útero, podendo corresponder a um grande hematoma, com acentuadas braquicardia
  fetal (26 bpm). Após 2 horas a paciente apresentou-se obnubilada, sudoréica,
  taquicárdica , com persistência da dor e BCF negativo. Optou-se por indução
  do parto com ocitocina e reposição volêmica. Evolui com sinais de choque hipovolêmico,
  e contrações uterinas eficientes, porém com colo não perceptível ao toque e
  aumento de sangramento. Foi encaminhada ao bloco cirúrgico para microcesárea.
  Durante o ato cirúrgico observou-se RU na cicatriz das histerorrafias anteriores,
  na porção lateral direita associado hematoma infiltrante em paramétrio direito,
  porção anterior do útero e dissecção do retroperitôneo à direita . Realizado
  anexectomia à direita, histerectomia parcial para reduzir tempo cirúrgico.
  Optou-se por não dissecação do grande hematoma. Encaminhada ao CTI onde permaneceu
  por 1 dia, tendo queda acentuada de hemoglobina, mesmo após grande transfusão
  de concentrado de hemácias. Novo US mostrou presença de grande quantidade de
  líquido na cavidade abdomino pélvica sugestiva de sangue, sendo encaminhada
  para reintervenção cirúrgica. Realizou-se hemostasia de pontos sangrantes,
  não pulsantes, em coto de anexo, principalmente .Foi reencaminhada ao CTI,
  apresentando melhora gradativa do quadro clínico, permanecendo neste por mais
  dois dias. Retornou à enfermaria da ginecologia e após 5 dias recebeu alta
  hospitalar.
 Discussão 
  Fora do trabalho de parto, a rotura uterina é extremamente rara. As espontâneas podem ser evidenciadas após esforço moderado ou traumatismo diminuto (tosse, palpação do abdomem); é um processo lento, progressivo e assintomático, que ocorre no final da gravidez, em cicatriz de cesareana e em zonas com alterações das fibras musculares (endometriose e adenomiose)(3). A síndrome da RU é associada à prenhez de 28 ou mais semanas de duração o que contrapõem com a idade gestacional deste relato, sendo esta de 20 semanas (6). Houve dificuldade do diagnóstico precoce devido ao caso não possuir fatores desencadeantes( traumatismos, uso de medicamentos ou iatrogenia) e por não ter apresentado os sinais de evidência de rotura uterina. A história pregressa de 3 cesáreas, sendo a última há 8 meses, justifica o quadro segundo a literatura (7). Há relação entre multiparidade e RU referindo ser cerca de vinte vezes mais freqüente nelas do que nas de baixa paridade (8). Os fatores desencadeantes de RU são o enfraquecimento local do miométrio, decorrente da má cicatrização e necrose isquêmica da parede uterina, enfatiza-se também a menor incidência da mortalidade materna, quando a redução da extensão do tempo cirúrgico é realizada em pacientes com estado geral alterado impedindo a piora do quadro clínico (7). Neste caso, optou-se pela histerectomia parcial, condizentes com a literatura acima citada. A vida da paciente depende, na maioria das vezes, da rapidez e eficiência com que se corrige a hipovolemia e a hemorragia (5).
 
 Conclusão 
· A assistência pré-natal é de suma importância, nas medidas relacionadas ao apoio, materno-fetal no decurso do ciclo grávido-puerperal.
· A importância do estímulo ao parto normal ou espontâneo quando bem indicado e assistido.
· O abuso e a liberalidade das indicações da operação cesárea têm sido responsabilizados por roturas de cicatrizes uterinas incidentes, inclusive, durante as fases finais
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